CORSAN foi subavaliada em mais de 1 bilhão na privatização

Jeferson Miola  //
Ilustração: Latuff  // 

A privatização, pelo governo Eduardo Leite/PSDB-MDB, da Companhia Riograndense de Saneamento, CORSAN, empresa responsável pelo abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto em 317 dos 497 municípios gaúchos, é alvo de inúmeras batalhas jurídicas e de desconfianças sobre falhas e irregularidades que causaram prejuízos relevantes ao Estado.

No seu voto sobre a privatização desta empresa estatal, a conselheira do Tribunal de Contas do Estado/TCE Ana Moraes demonstrou que na valuation [arbitragem de valor] da CORSAN o Banco Genial cometeu “erros consideráveis”, que tiveram como efeito deletério a subestimação do valor real da Companhia no mercado.

O Banco Genial é uma das empresas do bloco de consultorias contratadas por R$ 41 milhões sem licitação pelo Executivo estadual para a modelagem da venda da empresa, quando tal avaliação poderia ser realizada, com confiabilidade e proteção dos interesses públicos, por técnicos e especialistas do próprio Estado.

Há uma projeção, para baixo, de mais de 1 bilhão de reais na projeção feita pelo Banco Genial na previsão de lucro líquido da CORSAN. A comparação simples e direta com os resultados econômicos efetivos e o desempenho comercial da empresa desmonta totalmente a aferição lesiva feita pela consultoria privada.

O Banco Genial projetou um lucro líquido em todo exercício de 2023 de ao redor de R$ 200 milhões; enquanto os resultados efetivos, disponíveis em tempo real nos demonstrativos da empresa, projetam um lucro líquido de 1,27 bilhão de reais – mais de R$ 1 bilhão acima do projetado.

Na explanação do seu voto durante sessão do TCE de 20 de julho, Ana Moraes informou que só no primeiro trimestre deste ano o lucro líquido da CORSAN já é maior que a projeção da consultoria para todo o exercício de 2023!

Este aspecto é essencial na definição do valor de mercado da empresa. A subestimação do lucro líquido, que pode ter sido uma conduta deliberada – e, portanto, dolosa, para beneficiar a AEGEA – subestimou o valor do patrimônio líquido da CORSAN em pelo menos um bilhão de reais, caracterizando grave lesão ao interesse público.

Durante a exposição do voto, a conselheira destacou que

“É evidente que houve um grande impacto [na definição do valuation] em virtude de erros de projeção. Desse modo, é possível dizer que ao final do terceiro trimestre de 2022 já era perceptível que havia uma distorção. Não obstante a isso, o aviso de leilão número 1/2022 foi publicado em 29 de novembro de 2022 sem as correções das projeções das modelagens para fixar o valuation e o preço de referência para a formação de lances no leilão.

Ou seja, o gestor da CORSAN, mesmo tendo acesso em tempo real aos resultados financeiros e podendo fazer as correções ainda na fase interna da licitação, permaneceu silente quanto a estes fatos”.

A preocupação com a eventual ocorrência de ilícitos no processo de privatização da CORSAN fica implícita no voto da conselheira Ana Moraes [aqui].

Tanto que seu voto recomenda que além do Ministério Público Estadual, também a Polícia Civil seja cientificada do assunto, “para que exerçam, querendo, as suas competências, no que diz respeito ao disposto na Alínea A, desta parte expositiva” – item que elenca as irregularidades encontradas.

O TCE não está julgando a privatização da CORSAN em si, mas sim analisando os termos econômicos e financeiros desta operação, para que o Estado e a sociedade gaúcha não sejam lesados.

Mesmo que a privatização seja um dogma do governo ultraliberal comandado por Eduardo Leite, é inadmissível que esta obsessão ideológica ocorra com ilegalidades graves e o favorecimento obsceno de grupos privados em prejuízo de toda população.

O TCE demonstrou cabalmente que somente com a variável “lucro líquido” subestimada pelo governo tucano, o valor da CORSAN foi subestimado em R$ 1 bilhão, cifra que é irregularmente apropriada pelos novos donos.

Além deste fator que gera um subpreço bilionário, a subestimação também de outras variáveis que impactam na formação do valor de mercado da CORSAN corroboram o entendimento de que a privatização da empresa, além de representar um estelionato eleitoral do governador tucano, é um negócio ruinoso que beneficia grupos privados.